Inteligência artificial, Internet das Coisas (IoT), cidades inteligentes, automação ou Big Data. Certamente, para cada um de nós – em maior ou menor escala – todas estas denominações são familiares, pertinentes a tendências tecnológicas relevantes. No entanto, existem outras que, apesar de estarem diretamente relacionadas às tecnologias mencionadas, permanecem, injustamente, em segundo ou terceiro plano, apesar do impacto concreto que podem ter nas organizações no curto prazo.
Um desses casos poderia ser o dos “gêmeos digitais” (digital twins), uma tendência que tem sido considerada nos últimos anos pela Gartner[1] como uma das 10 mais relevantes no âmbito de TI, para o presente e futuro próximo. Assim como dizíamos, os gêmeos digitais são uma mescla de diversas tecnologias e têm como qualidade fundamental materializar a união entre o mundo físico e o virtual, criando um mundo ciberfísico inteligente, onde é possível antecipar os cenários para prevenir ou melhorar a condução de ativos.
Em termos mais específicos, os gêmeos digitais foram definidos pela Gartner como um padrão de desenho de software que representa um objeto físico cuja finalidade é compreender o estado do ativo, responder oportunamente às mudanças, melhorar as operações comerciais e agregar valor.
Para entender melhor do que se trata, é necessário entender a origem do conceito, que remonta à época da corrida espacial, quando a NASA desenvolveu a tecnologia de emparelhamento para operar, reparar e fazer a manutenção das naves espaciais que não estivessem ao alcance do monitoramento físico. Assim, por exemplo, na falida missão do Apolo XIII com este modelo, foram realizadas provas que permitiram o retorno seguro da tripulação à Terra. Atualmente, a agência espacial americana utiliza os gêmeos digitais para desenhar, testar e construir novos equipamentos; isto é, uma vez que as definições e provas são feitas virtualmente, logo se passa para a construção física. Em seguida, através de sensores instalados nele, esse dispositivo físico passa a ser vinculado a seu par virtual para monitorá-lo e realizar sua manutenção de maneira inteligente.
Os gêmeos digitais vêm assim complementar o uso da tecnologia para o desenho de equipamentos ou estruturas, para levar os modelos digitais a um novo nível. Através da instalação de sensores no objeto físico, são obtidos dados em tempo real que permitem monitorar e manter o gêmeo real, antecipando inclusive cenários reais com exatidão. No entanto, os gêmeos virtuais poderiam ser aplicados não só a ativos físicos, mas também a serviços e processos, de forma que se prevê um amplo espectro de aplicativos, sendo que as organizações mais avançadas em implementar soluções de IoT serão as que primeiro sentirão o impacto de seu uso.
Segundo dados da Gartner, 13% das organizações que atualmente implementam projetos de IoT já utilizam gêmeos digitais, enquanto 62% encontram-se no processo de estabelecer seu uso para o próximo ano. A consultoria prevê que para 2022, mais de dois terços das empresas que implementaram IoT terão implantado ao menos um gêmeo digital, ainda que se acredite que esse prazo poderia ser antecipado em um ou dois anos.
Em breve, os gêmeos virtuais serão elementos chave nas cidades inteligentes. Já há experiências concretas de monitoramento de edifícios ou estruturas em países como a Noruega, Índia, Estados Unidos, Alemanha, Austrália e Singapura, entre outros. Em tais lugares, os sensores e dispositivos instalados em todo tipo de infraestrutura urbana – como pontes, por exemplo – enviam dados que são analisados no modelo virtual para antecipar o desgaste de materiais ou eventuais falhas e sua correção mais certeira e oportuna.
Os setores de construção, energia, transporte e indústria são os mais entusiasmados hoje com a implantação deste tipo de solução, que lhes permite economizar custos e reduzir as falhas na fabricação de seus produtos, assim como ter noções exatas de seu comportamento ou funcionamento histórico e antecipar erros ou avarias, simulando inclusive os reparos no gêmeo virtual. Isto permitirá também que as empresas possam trabalhar de forma conjunta e eficiente com seu ecossistema digital, aperfeiçoando seus produtos e serviços, de forma inédita.
De alguma maneira, é factível pensar inclusive que no futuro todo nosso mundo, incluindo os seres humanos, tenha seu gêmeo digital. Nesse mundo virtual, será jogada grande parte da realidade física, rota para a eficiência e perfeição de processos que só a tecnologia pode oferecer. O mundo ciberfísico chegou para ficar.
[1] https://www.gartner.com/en/newsroom/press-releases/2019-02-20-gartner-survey-reveals-digital-twins-are-entering-mai
Luis Piccolo
Vicepresidente de Ventas, Cluster Sur
Lumen, América Latina